quinta-feira, 28 de março de 2013

Tráfico de pessoas é maior entre mulheres e crianças


Por Márcia Regina Viotto é socióloga e assessora da CTB.

Recentemente em São Paulo, através do Fórum Paulista de Prevenção e Erradicação do Trabalho infantil, pude participar de debate sobre “Tráfico de pessoas: crianças e adolescentes”. O evento contou com a presença da inspetora e presidente da comissão nacional de Direitos Humanos da Policia Rodoviária Federal, Márcia Freitas Vieira, e a Dra. Claudia Patricia Luna, advogada, presidente da ONG Elas por Elas vozes e Ações das Mulheres. Ambas fizeram uma oportuna exposição sobre o tema na ótica dos direitos humanos.
Segundo a inspetora, no mundo US$ 32 bilhões são gerados pela indústria do tráfico e vitimiza cerca de 2,5 milhões pessoas (dados do Ministério da Justiça e da Política Federal Rodoviária). O trafico é a 3ª atividade no Brasil, que é um dos países com maior incidência deste crime. Segundo dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) indicam que a exploração sexual é a forma de tráfico de pessoas com maior frequência (79%), seguida do trabalho forçado (18%), atingindo, especialmente, crianças, adolescentes e mulheres.
A inspetora nos informou que hoje a polícia rodoviária federal conta na sua responsabilidade a vigilância de 70.000 km de rodovias federais e 422 postos de fiscalização, e uma das ações, dentre várias, é coibir o tráfico de pessoas e a exploração sexual, combate do trabalho escravo e a entrada irregular de pessoas. São vários os tráficos praticados: armas, drogas, animais, plantas, pessoas, a remoção de órgão, servidão, exploração sexual, trabalho escravo, adoção ilegal e outros crimes. Ela aponta que “há dificuldades em nossa legislação e que não está adequada para enfrentar esse grave problema, pois ainda há uma visão que se limita à exploração sexual. O nosso Código Penal só especifica como crime de tráfico de pessoas aquele praticado para fins de exploração sexual. Há um tráfico interno (praticado até por familiares), que creio não é novidade para ninguém. Outra dificuldade é o entendimento da vitima. Hoje o tráfico está mais camuflado e é feito por ônibus rodoviários, carros de passeio, etc.”.
A inspetora aponta a necessidade de ações integradas, de rotinas educativas, da ação do governo, do publico e do privado, convênios e ações de inteligência.  Hoje já com o II Plano de tráfico de pessoas, existem 23 instâncias governamentais envolvidas e apesar do insuficiente contingente de recursos humanos a Policia Rodoviária Federal está preparada para enfrentar o tráfico, para tanto afirma a inspetora Marcia:  precisamos fortalecer o trabalho em rede, melhorar os diagnósticos, capacitar  e aumentar o efetivo policial e os recursos materiais.
Aproveitando o gancho da novela do horário nobre da Globo, “Salve Jorge” de autoria de  Gloria Perez, o assunto foi  massificado, levando a milhares de lares brasileiros, dando visibilidade à realidade perversa no Brasil e no mundo sobre o tráfico de pessoas, que tem como presa fácil as pessoas pobres e excluídas da sociedade. Simone, Kelly, George, e tantos outros milhares de jovens acreditaram em promessas de trabalho no exterior e se viram presos numa armadilha cruel, de escravidão, prostituição e morte. São elas, principalmente as mulheres de baixa renda e com pouca instrução, seduzidas por proposta tentadoras de mudar de vida, de ganhar dinheiro fácil, cujo único objetivo dos aliciadores é lucrar com o crime organizado mundialmente. O destino é: Suriname, Suíça, Espanha, Holanda.
Segundo dados da Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça, os estados mais visados são: Pernambuco, Mato Grosso do Sul e Bahia.
A problemática está na tela da Globo, fundidas nas personagens de  Jéssica (Carolina Dickmann) e  Morena (Nanda Costa) da novela das nove "Salve Jorge", de Glória Perez. Em depoimento se afirma sobrevivente do tráfico: "Eu trabalhava das 9h à meia-noite. Tinha que 'fazer' até 20 homens por dia. Ninguém aguenta. A gente não saía nem pra comer. Quando tentamos fugir, minha amiga foi morta", lembra a maranhense de 48 anos que vive no Rio, e diz que “a novela é light perto do que eu vivi”. “A censura não deixa mostrar tudo” e afirma que além de vitimas pela rede de prostituição elas ainda são estigmatizadas pela sociedade. (FSP 9/12/12)
Já a Dra. Claudia lembrou que a escravidão vem de longa data em nosso país, onde as pessoas são vistas como coisas, são vistas como não pessoas e ressalta a violência, que para as crianças começa no lar, aqueles desestruturados pela condição de miséria, que muitas vezes a expulsa para as ruas, onde se tornam ainda mais vulneráveis. Por isso é fundamental a visibilidade, já que não temos como lutar contra o que não é visível.
Ela aponta também que precisamos ter um olhar apurado para detectar o tráfico, em suas diversas formas, pois ele varia de região para região e que a prevenção deve ser cotidiana. Nos contou o caso de uma menina que  todo ano tinha um filho(a), levada a fazer pré-natal (área da saúde), aparentemente com problemas leves mentais, por um “tio” e somente depois de alguns partos, com olhar mais apurado do serviço público pode se detectar que se  tratava de gravidez para tráfico de bebes, cujo o tal “tio” era o pai e vendia os bebes. Cruel e real.
Com os grandes eventos, como as festas de peão, formula 1, feiras, olimpíadas, copa, etc., é preciso que se tenha políticas públicas que façam a prevenção. Sabe-se que os aliciadores são homens a partir de 30 anos, cujos compradores também são homens. A mulher é utilizada como caminho para o crime transnacional, que pode ocorrer de diversas formas, como por exemplo, pelo turismo, intercâmbios de estudantes, agência matrimonial, dentre outras.
Outro dado importante que a novela não aponta, quando não coloca atrizes negras e pardas, já que elas são as principais vitimas.
A presidenta da Comissão Parlamentar do Tráfico Nacional e Internacional de Pessoas, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), promoveu a CPI do tráfico de pessoas e identificou mais de 200 rotas de comercialização ilegal de seres humanos no país, a maioria na região norte. As maiores vítimas são crianças, mulheres e travestis de baixa renda. A CPI fez uma radiografia de 2003 a 2011 e durou um ano e meio e se criou a Frente Parlamentar de combate ao tráfico de pessoas. Como relatora da CPI, Lídice da Mata (PSB-BA) fez várias sugestões como considerar o tráfico como crime a ser punido com pena de quatro a dez anos de prisão mais multa. O relatório final da comissão foi aprovado em 19/12/2012. O documento não responsabiliza nem indicia ninguém, mas traz a minuta de um projeto de lei que torna mais rígida a legislação brasileira de combate ao tráfico humano. Será também apresentada emenda na comissão especial que analisa mudanças no Código Penal, estabelece pena de prisão para quem agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso.
O Brasil desde 2006 vem pactuando plano de enfrentamento ao tráfico de pessoas, já no seu II plano vem elaborando política permanente de Estado, consolidando princípios, diretrizes e ações de prevenção, repressão e responsabilização de seus autores, bem como o atendimento às vítimas.
Atualmente, mais de 30 pessoas, entre homens e mulheres, cumprem pena no Brasil devido ao crime de tráfico de pessoas, segundo o Ministério da Justiça; de tal forma que é preciso estabelecer lei e penas duras para enfrentar esse hediondo crime, bem como fortalecer a policia federal nas fronteiras e estabelecer políticas públicas de prevenção, a partir do município através de sua rede publica: saúde, educação, segurança, dentre outras para enfrentar o tráfico em suas diversas e perversas modalidades.

oc marcia viotto
Márcia Regina Viotto é socióloga e assessora da CTB.

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