sexta-feira, 14 de março de 2014

Em homenagem a Castro Alves, hoje é dia da poesia!

Um dos maiores poetas brasileiros, Castro Alves nasceu em 14 de março de 1847. Por isso, essa data foi escolhida para celebrar o Dia da Poesia – homenagem criada para difundir a poesia e a linguagem literária.

Muita poesia para você neste dia e boa leitura!


A CANÇÃO DO AFRICANO

CASTRO ALVES
Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
Junto ao braseiro, no chão,
Entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão ...
De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar...
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez pra não o escutar!
"Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o sol vem;
Esta terra é mais bonita,
Mas à outra eu quero bem!
"0 sol faz lá tudo em fogo,
Faz em brasa toda a areia;
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!
"Aquelas terras tão grandes,
Tão compridas como o mar,
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar ...
"Lá todos vivem felizes,
Todos dançam no terreiro;
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro".
O escravo calou a fala,
Porque na úmida sala
O fogo estava a apagar;
E a escrava acabou seu canto,
Pra não acordar com o pranto
O seu filhinho a sonhar!
O escravo então foi deitar-se,
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do sol nascer,
E se tardasse, coitado,
Teria de ser surrado,
Pois bastava escravo ser.
E a cativa desgraçada
Deita seu filho, calada,
E põe-se triste a beijá-lo,
Talvez temendo que o dono
Não viesse, em meio do sono,
De seus braços arrancá-lo!
Fonte: Jornal da Cidade - http://www.jornalacidade.com.br/

Sobre o Estado da Palestina


Lejeune Mirhan *

Essa semana que passou, passei uns dias na terra em que nasci, Corumbá, que não visitava desde 1991. Mas, como militante comunista não descansa, reuni-me com o presidente do Partido local, que por sua vez organizou uma reunião com a comunidade palestina, por sinal muito forte. Fizemos um belo debate. Quero compartilhar com meus leitores algumas reflexões que fiz com os companheiros.


A luta pela proclamação do Estado da Palestina é longa. Aquela terra – considerada sagrada para bilhões de pessoas no mundo – foi palco de conquistas durante os últimos três mil anos. Diversas civilizações e impérios a conquistaram, em especial Jerusalém. Não pretendo discorrer sobre a história dessas conquistas.

O que é certo dizer é que em poucos momentos os palestinos conseguiram ter seu estado edificado, até porque essa concepção de estado nacional é recente – período pós Vestefália, 1648 – e nessa época a Palestina era ocupado pelo império turco- otomano, que dura oficialmente até 1920. Nesse momento, a região já era ocupada pelos ingleses e franceses, basicamente, as potências imperiais de então. Na chamada Conferência de San Remo foi feito uma primeira partilha do Oriente Médio, ficando a Palestina e o Iraque com a Inglaterra e o Líbano e a Síria com a França.

Mais uma vez, os palestinos não puderam ter seu estado nacional, ainda que tivessem uma administração com certa autonomia. Com o chamado mandato britânico, vai ocorrer uma intensa migração judaica para a região (Aliyah em hebraico), incentivada parte pela própria Inglaterra, parte fruto de perseguições aos judeus na Europa. O resto é história e todos sabemos. A ONU, sob a comoção das perseguições e dos massacres ocorridos na Alemanha nazistas que atingiram em especial os judeus, por pressão do sionismo internacional, acaba por votar o Plano de Partilha da Palestina em 29 de novembro de 1947.

Um povo que vivia milenarmente em suas terras, de uma hora para outra vê arrancado de seu território histórico 54% de todas as suaeus terrasitórios e entregue a um contingente de pessoas que vieram do mundo inteiro e que nada tinham a ver com aquelas terras. Eram estranhos, alienígenas, forasteiros, usurpadores. Baseavam-se pura e simplesmente em uma lenda bíblica que o seu deus havia lhes prometido aquelas terras. Nada contra que cada deus prometa terras para seu próprio povo, mas não a terra de um povo que já era dono dela! Aliás, Israel baseia-se em quatro grandes mentiras e a maior delas sempre foi “uma terra sem povo para um povo sem terra” (sic).

A votação da ONU foi relativamente apertada. A Organização contava apenas com 57 membros. A única ausência foi a Tailândia. Dos 56 que votaram, 33 foram a favor da Partilha (58,8%), 13 contra e houve 10 abstenções. Interessante registrar que a URSS apoiou a criação e anos depois retirou o apoio. Os EUA se abstiveram. O Brasil, com Osvaldo Aranha, presidia a sessão e votou pela Partilha.

Registro aqui um fato muito interessante. No seu discurso final no Congresso Sionista da Basileia (Suíça), em 1897, Theodor Herzl, líder do movimento afirmou que em até 50 anos eles teriam seu Estado na Palestina. Pois em articulação com o imperialismo inglês, o sionismo cumpriu sua profecia e em 29 de novembro de 1947 a ONU partilhava terras que não lhe pertenciam e criava dois estados, coisa que a Carta das Nações jamais permitiria acontecer.



Desdobramentos da Partilha


A Inglaterra, cumprindo o que anunciara e em comum acordo com o sionismo, retira suas tropas da Palestina no dia 13 de maio de 1948, menos que seis meses da aprovação pela ONU da Partilha. No dia seguinte, o mais destacado sionista daquela época, Ben Gurion, proclama a criação do Estado de Israel. Também daí em diante já sabemos a história. Conforme podemos ver no mapa que ilustra essa matéria, o que era 54% passou a mais de 70% e hoje os sionistas e seu projeto colonial já dominam 80% de toda a Palestina histórica.

Bem, os árabes à época, que compunham a Liga Árabe, eram praticamente apenas o Egito, a Jordânia, o Iraque, o Líbano e a Síria. Seus exércitos tentaram ainda impedir a tomada das terras. Mas, as forças sionistas, muito melhor armadas, preparadas, usando de métodos do terror, acabaram vencendo o despreparado exército árabe. O Estado de Israel era uma realidade. Coube aos árabes negar o tempo todo essa partilha, não reconhecendo o novo Estado sionista.

O primeiro Estado árabe a reconhecer Israel foi o Egito, em polêmica decisão que acabou custando a vida do seu então presidente Anuar El Sadat assassinado em 1981. Visitou Israel em 1977 e em 1979 assinou um acordo de paz, vigente até os dias atuais. Depois disso, apenas a Jordânia reconhece Israel, dos 21 países árabes (fora a própria Palestina que ainda não tem o seu Estado nacional). Ou seja, transcorreram 32 anos da decisão da ONU até que um estado árabe reconhecesse Israel.

Passaram-se 40 anos, mais precisamente em 15 de novembro de 1988, a OLP, Organização para a Libertação da Palestina, em seu histórico Congresso de Argel, quando reunia o chamado Conselho Nacional Palestino, uma espécie de parlamento no exílio, votou o que foi chamado Declaração de Independência e Yasser Arafat foi indicado presidente da Palestina, como a própria ONU passou a chamar a OLP (era membro da Organização como observador).

Dessa votação no parlamento no exílio participaram delegados/deputados de todos os palestinos espalhados pelo mundo, assim como os que viviam nos territórios ocupados. Era Foram 309 pessoas de todas as correntes e partidos que integram a OLP. Os termos da Declaração de Independência, ao mesmo tempo que proclama o Estado da Palestina, reconhece a existência de Israel. Pela primeira vez em 40 anos isso acontecia.

O resultado da votação foi expressivo: 253 votos a favor, ou 81,87% dos votos, 46 contra, ou 14,88% e apenas 10 abstenções ou 3,23%. Arafat sai fortalecido desse processo, mas em todos esses 25 anos decorridos da proclamação de Independência, Israel e EUA jamais reconheceram o direito dos palestinos terem o seu Estado nacional.

A ONU votou na Assembleia Geral das Nações Unidas em setembro de 2012 a admissão da palestina como Estado não-membro e o resultado foi , por 138 votos a favor (73,4%), com insignificantes 9 votos contrários ou 4,78% dos votos (EUA, Canadá, Panamá, Israel, República Tcheca e países-ilhas do pacíficos, Palau, Micronésia, Ilhas Marshal e Narau). Houve ainda 41 abstenções (21,8%) entre 188 votantes (cinco ausências de 193 estados-membros).

De fato, a reivindicação era de que a Palestina seria o 194º Estado membro da ONU. No entanto, a correlação de forças ainda não permite essa solução. Praticamente todos os países defendem a solução de “dois estados para dois povos”, ou seja Israel temia o reconhecimento de todos os países árabes e do mundo como já é reconhecido, mas os Palestinos ganham, finalmente, o seu Estado autônomo, independente.

Essa votação, ainda que simbólica já que a Palestina é apenas um estado-observador não-membro, status que apenas o Vaticano possuía, mostra uma grande derrota do sionismo e do imperialismo estadunidense. Ficaram isolados. Obama, que faz apenas o que os sionistas decidem, insistiu em “negociação direta entre as partes” (sic). Isso é uma verdadeira falácia. Imaginemos que o seu vizinho invada a sua casa armado até os dentes e tome-lhe 80% de sua propriedade. Ou você chama um terceiro mais poderoso para ajudar-lhe ou negociar “direto” com o ocupante acontecerá em condições de sempre em completa desigualdade de condições. É como se o oprimido negociasse a sua libertação com os opressores. Por isso, só com a luta os palestinos conquistarão alguma coisa.



A concretização do Estado da Palestina


De meu ponto de vista, estamos longe ainda de termos um Estado edificado com todos os seus direitos. A Palestina não sabe qual é seu território. Não podem ter o seu exército, a sua moeda, não arrecadam impostos diretamente, não possuem nenhum aeroporto com linhavoos regulares. Não existe no mapa. No máximo, vemos dentro do mapa de Israel uma pequena área chamada de “territórios palestinos ocupados”. A primeira vez que fui para a Palestina, entrei por Tel Aviv. Além do interrogatório e transtorno de horas com a polícia secreta, exigi que meu passaporte não fosse carimbado. Até porque não estava indo para Israel, mas para a Palestina ocupada.

Como expliquei em artigo anterior, em SP optamos em criar um Comitê de Apoio à criação do Estado da Palestina. Quase 80 entidades entenderam que é fundamental apoiar a criação desse sonhado Estado da Palestina. No entanto, como estão as coisas hoje no chamado “processo de paz” na Palestina?

Não vou aqui entrar no debate teórico se devemos defender apenas um Estado, chamado “Palestina”, que seria o fim de Israel. Isso é inconcebível na atual correlação de forças de poder no mundo. O imperialismo estadunidense está decadente, mas ainda eles são a maior potência econômica da terra e imbatíveis militarmente. Os palestinos tomaram a decisão de ter o seu Estado em território que eles controlem. Esse assunto tratei em meu último livro intitulado E se Gaza cair... (Editora Anita).

Aqui, temos dito que existem três pontos que são fundamentais nas discussões. São eles: 1. Qual o território deveria ter o novo Estado da Palestina? 2. Como receber os cinco milhões de refugiados palestinos de volta? 3. Como instalar a capital em Jerusalém?

Como analista internacional, temos que acompanhar o curso dos debates. Mas, sou extremamente pessimista neste caso. Não só pelo fato que a crise na Síria roubou completamente o foco da causa palestina, como o recente golpe da direita na Ucrânia move as atenções do mundo para a Ásia. No entanto, a imprensa noticia quase que diariamente opiniões, seja do governo israelense, seja do presidente palestino Mahmoud Abbas sobre o “andamento das negociações de paz”.

Não vejo nenhuma evolução no processo de paz. Na verdade Israel, ou pelo menos o governo direitista que comando o Estado sionista hoje, não quer nem paz, nem garantir a existência de um Estado da Palestina, mesmo que a ONU e 138 países reconheçam a Palestina nessa condição (com embaixada e tudo mais; dados de novembro de 2012). Quero comentar cada um dos três pontos polêmicos listados acima.

1. Território do Estado – Hoje se toda a Cisjordânia fosse devolvida aos palestinos com a Faixa de Gaza, o novo Estado teria uma extensão de no máximo 22% da Palestina histórica e ainda assim sem ligação por terra entre essas duas áreas. Mas, seguindo a linha de que mesmo com um quinto de suas terras originais, os palestinos aceitassem essa proposta (essae era a área que os árabes controlavam antes da Guerra dos Seis Dias em junho de 1967), surge um problema a meu ver quase intransponível. As colônias e os assentamentos judaicos na Cisjordânia. E uso esses termos sob protesto, pois nada têm a ver com as experiências brasileiras de colônias e assentamentos agrícolas.

Nunca saberemos o número exato. Os dados mais confiáveis dão conta de que existem – oficialmente – 168 assentamentos com 400 mil judeus neles morando. No entanto, fala-se em 250 assentamentos e meio milhão de judeus, neste caso os mais ortodoxos possíveis e armados até os dentes e protegidos pelo Exército de Israel. Nas duas vezes que fui à Palestina vi esses assentamentos. São casas luxuosas, a maioria com piscinas, muros de cinco metros ao redor.

Nunca me esqueço o desmantelamento de apenas sete assentamentos na Faixa de Gaza, feito de forma unilateral pelo general Sharon em 2005 quando primeiro Ministro. A comoção nacional, a resistência dos colonos, o enfrentamento. Ai fico me indagando: que forças hoje tirariam meio milhão de judeus deos 250 assentamentos?

2. Direito de Retorno – A primeira Lei que Israel votou quando de sua proclamação como Estado nacional formado pela ONU foi a chamada Lei do Retorno. Ela diz resumidamente assim: todo e qualquer pessoa em qualquer parte do mundo que professe o judaísmo, se proclame judeu e queira voltar para a Palestina/Israel é imediatamente reconhecida como cidadão israelense, possui cidadania e passaporte desse país e tem todos os direitos.

Isso é sumariamente negado aos donos originais das terras. Milhões de refugiados, seus filhos e netos que nasceram em outros países por mera impossibilidade de viverem em suas terras e se consideram palestinos, não podem jamais voltar para a Palestina.

Como resolver esse problema? Israel tem hoje 8,1 milhões de habitantes, dos quais 1,4 milhões são palestinos-árabes. Ai estão computados apenas os que ficaram dentro do território israelense, mais Jerusalém e colinas de Golã (na Síria). Isso significa que 17% de toda a população de Israel é árabe.

Imaginemos que nos acordos de paz a Lei do Retorno valha para os palestinos espalhados pelo mundo, ou seja, qualquer palestinos e seus descendentes nascidos no exílio – diáspora forçada – tenham o direito de voltar e receber a cidadania Palestina. Isso significa 6,4 milhões que somados aos 4,2 milhões que vivem em Gaza e na Cisjordânia totalizariam 10,6 milhões. Um desequilíbrio populacional que deixaria em pânico os fundadores do estado sionista, que ficariam em minoria.

Surge assim, nas mesas de negociação uma proposta alternativa, que seria admitir a volta de um percentual – não há proposta de índice – e os restantes receberiam uma indenização. Aqui surgem as dúvidas: mesmo não tendo direito de fixar residência na Palestina, esses que não voltariam seriam considerados cidadãos palestinos e poderiam visitar as suas famílias seja na Palestina seja em Israel? Se for acordado o pagamento de indenização, que faria esse pagamento? Israel? A ONU? Os países imperialistas? Não se tem resposta alguma a essas questões.



Por fim, o último e não menos polêmico quesito.


3. Jerusalém como Capital – Tanto os palestinos quanto os israelenses, praticantes do judaísmo, consideram essa cidade sagrada (além dos cristãos e muçulmanos, claro). O sonho de Israel desde 1948 era ter Jerusalém como capital de seu país, reivindicação essa que nem seu maior apoiador, os EUA, admitem. Sua capital oficial é Tel Aviv.

A parte antiga de Jerusalém, sempre foi majoritariamente árabe e palestina. Lá moram em torno de 1,2 milhões de palestinos. No entanto, praticamente todas as semanas nos chegam notícias de que Israel autorizou a construção de uma nova colônia judaica na parte árabe da cidade.

Como solucionar esse problema? As propostas que acabam aparecendo na mesa dos negociadores é Israel ficar com a parte moderna da cidade e a parte histórica com os palestinos. Isso nos apresenta dois imensos problemas. O primeiro, são as colônias judaicas nessa região chamada também de Oriental. Como desalojar milhares de judeus ortodoxos das suas casas e demoli-las todas? O outro e maior problema é que justamente nesta parte da cidade fica o chamado Muro das Lamentações, que os judeus acreditam que teria sido parte do que restou do famoso Templo de Salomão (a que não se tem registro histórico algum de suas existências, nem do personagem, um dos muitos mitos bíblicos e nem do templo em si).

De nossa parte, apoiaremos o povo palestino e sua liderança qualquer que venha a ser a decisão que eles tomem. Não cabe a nós, do movimento da solidariedade, dizer o que os palestinos devem fazer, mas sim apoiá-los.

Quero finalizar, No entanto, que sigo pessimista sobre a possiblidade de uma paz longa, duradoura, justa que assegure direitos aos palestinos, em especial a do seu Estado soberano, autônomo e independente.

FGTS pode ser usado para pagar pensão alimentícia

A Justiça Federal decidiu ontem, (13) que o trabalhador pode usar o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para pagar a pensão alimentícia. O entendimento foi firmado pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), vinculada ao Conselho da Justiça Federal (CJF).


Os integrantes do colegiado decidiram restabelecer uma decisão da Justiça de Santa Catarina que autorizou um trabalhador a sacar o valor retido na conta do FGTS para fazer o pagamento do débito. A decisão foi revertida em função do entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autoriza o saque.

De acordo com a turma, apesar da Lei 8.036/90, que trata dos casos em que o dinheiro pode ser sacado, não definir que o dinheiro do FGTS deve ser utilizado para pagamento de pensão, a necessidade de garantir alimentos é assegurada pela Constituição.

"Segundo o entendimento do STJ, está a obrigação alimentícia devida pelo titular da conta vinculada a seus dependentes, em decorrência dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana”, afirmou o juiz federal Gláucio Maciel, relator do processo.

Fonte: Agência Brasil via Vermelho

Salvador sedia Seminário Nacional dos Bancários da CTB

Líderes sindicais de mais de 12 estados brasileiros
vão se reunir para debater as questões mair urgentes da categoria

Campanha salarial 2014 e organização da CTB Bancários serão os principais temas em discussão no Seminário Nacional dos Bancários da CTB, que acontece no sábado e domingo (15 e 16), no Hotel Portobello, em Salvador (BA). A abertura será no sábado, às 9h, com um debate sobre conjuntura política e econômica nacional.


Com um público formado por dirigentes sindicais de pelo menos 12 estados, o encontro tem o objetivo de debater as propostas dos cetebistas para a campanha salarial dos bancários, buscando alinhar as propostas defendidas nas assembleias e nos encontros nacionais para construção da pauta de reivindicações.

“A CTB Bancários tem clareza da importância estratégica que tem na luta dos trabalhadores. Nós participamos da mesa de negociação, levando nossas proposições e buscamos influenciar na obtenção de novas conquistas para a categoria. Temos tido vitórias importantes nos últimos anos, não apenas em reajustes, mas também em novas cláusulas coletivas, mas temos que manter a mobilização para tentarmos arrancar novas conquistas dos banqueiros, o que não é tarefa fácil”, acrescentou Eduardo Navarro, dirigente nacional da CTB, Federação dos Bancários da Bahia e Sergipe (Feeb).

Max Altman: A realidade do cenário venezuelano

Tudo leva a crer que uma vez mais, nesse tumultuado caminho
 percorrido pela Revolução Bolivariana nos últimos quinze anos, ela sai vitoriosa.

Passado um mês dos protestos insuflados e comandados por Leopoldo López e Maria Corina Machado, do partido de extrema direita Vontade Popular, sob o lema “A Saída”, ou seja, a deposição do governo Maduro, como se apresenta o cenário venezuelano, não aquele estampado nos meios de comunicação internacionais, e sim o que mostra a realidade?

Por Max Altman*, na Opera Mundi


As ações se tornaram mais violentas e menos expressivas, resumindo-se praticamente à formação de guarimbas – obstáculos de entulhos, galhos de árvore, pneus etc. que impedem a livre circulação de pessoas e veículos – e estão localizadas em municípios de classe média alta, governados por prefeitos da oposição, em Caracas e em estados como Miranda, Táchira, Mérida, Carabobo, entre poucos outros. Não se registrou nenhum protesto com essa ou outra característica em bairros populares de Caracas ou em setores populares de municípios importantes país afora.

Circunscritas a setores radicais da classe alta, que se valem de reiterados atos de vandalismo contra pessoas e bens, as ações não conseguiram, sequer minimamente, alcançar setores populares, associações de trabalhadores da cidade e do campo, organizações sociais. Há duas semanas uma manifestação de operários petroleiros da PDVSA, que foram levar o contrato coletivo de trabalho ao Palácio Miraflores para o presidente Maduro também assinar, reuniu dezenas de milhares de trabalhadores, além de cerca de 30 mil populares.

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Os setores radicais fascistas abandonaram a consigna “A Saída”, que visava derrubar o governo Maduro, e a eles resta acusar o governo de responsável pelas mortes, prisões e torturas. Capriles, embora ainda se movimente no sentido de preservar sua liderança na oposição, dissente abertamente de Leopoldo López e Corina Machado, mas acaba de ser vaiado por manifestantes em ato público convocado pela oposição. Deputados dos partidos que compõem a Mesa da Unidade se desligaram da coalizão, criticando-a por não comparecer à Conferência Nacional de Paz convocada por Maduro. A moção dos Estados Unidos de intervenção na Venezuela, apoiada pelo Canadá e apresentada pela mão peluda do Panamá ao pleno da OEA, sofreu histórica derrota por 29 a 3. 

A unidade cívico-militar se mantém coesa e firme. Não se tem notícia de qualquer fissura nas forças armadas. O desfile militar de 5 de março em homenagem a Hugo Chávez no primeiro ano de sua morte, diante de dezenas de milhares de assistentes, foi marcado pelas palavras de seu comandante de fidelidade à Constituição, à Revolução Bolivariana, ao socialismo e ao legado de Chávez. De resto, o comandante estratégico operacional da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB), general Vladimir Padrino, em comunicado oficial datado de 6 de março, ratificou que a instituição militar do país não se prestará para a barbárie, nem para golpes de Estado, nem para violentar a vontade popular. E que a FANB obedece a princípios e valores, respeitosa dos direitos humanos, e age nos estritos termos da Constituição da República Bolivariana da Venezuela.

Nesse mesmo comunicado repudiou as acusações de “repressiva” e “violenta” que lhe foram feitas por “setores da direita nacional e grupos vandálicos que semeiam o terror em alguns municípios” e insistiu: “Exijo respeito aos nossos soldados, empenhados em devolver ao povo sua tranquilidade, nosso mais apreciado tesouro como nação”. Por fim, observou: “A campanha mediática empreendida contra a FANB é uma batalha entre o bem e o mal, entre a verdade e a mentira, e os soldados bolivarianos vamos, junto a Deus, abrindo caminho de liberdade, independência e progresso para construir a pátria de Bolívar e Chávez. As ações violentas que cerceiam os direitos fundamentais da sociedade buscam que se rompa o fio constitucional e buscam desesperadamente um ponto de inflexão na FANB”. Em vão.

As ações de vandalismo e assassinatos ocorridos nas últimas semanas são de responsabilidade de pequenos grupos de oposição que, desrespeitando a vontade popular expressada nas urnas, apostam na violência para criar um ambiente de descontentamento na sociedade. Essa minoria, porém, terminou por deixar a totalidade da oposição numa posição muito grave por revelar o caráter violento da direita. O governo da Venezuela tem todo o direito de defender sua soberania e independência contra as ações perpetradas por grupos vandálicos que impedem os cidadãos de gozar de suas liberdades.

São assombrosas a desinformação, a distorção e as mentiras da grande imprensa em todo o mundo, que se presta a apresentar o ódio, o vandalismo e a morte como oposição a um governo e atribui os 21 óbitos ocorridos até o presente à repressão de militares e policiais. Quatro dessas mortes são de responsabilidade do Serviço Bolivariano de Inteligência, cujos agentes desrespeitaram ordens superiores, foram identificados e estão presos. Entre as demais vítimas, três motociclistas foram degolados por arame farpado estendido poste a poste pelos guarimberos quando transitavam em seus veículos; dois motoristas foram arremessados de carros que se chocaram com a guarimba; uma pessoa despencou de um mezanino; um trabalhador, irmão de um deputado do PSUV, foi fuzilado quando limpava uma guarimba; duas pessoas foram fuziladas por franco-atiradores postados no alto de edifícios; e por aí vai. Tudo isso ocorreu em bairros de classe média alta simpáticos à oposição. Como pode a mídia, fazendo eco ou não à oposição, atribuir essas mortes às forças do governo, quando o Ministério Público está examinando um a um os casos? Os poderes públicos agem em relação aos atos de violência em conformidade com a Constituição e as leis, exatamente como ocorre em outros países democráticos.

Além de a mídia internacional publicar fotos de repressão policial ocorrida em outros países como se tivesse sido na Venezuela, relato sucintamente até que ponto a mídia venezuelana, porta-voz da direita, se comporta: a televisão acabava de transmitir outra notícia estarrecedora: havia sido assassinado com um tiro nas costas um sargento da Guarda Nacional que estava levantando os escombros da guarimba e liberando a via para que a comunidade pudesse ter vida normal. Isso ocorreu em Los Ruices, município de Chacao, no estado de Miranda, governado por Henrique Capriles. O primeiro que lançou uma versão falsa foi um jornalista do diário El Universal, Deivis Ramírez. Segundo ele, havia um grupo de motociclistas chavistas e a Guarda Nacional chegou e, supostamente, matou o mototaxista. Em seguida, outro mototaxista matou o guarda. Há de se ter uma mente bem perversa e suja para lançar tal versão, quando se comprova com testemunhas, vídeos e fotos que tanto o mototaxista como o sargento foram mortos por tiros que partiram de um dos edifícios. E foi publicado com destaque em El Universal, na edição de 7 de março.

Um dos episódios marcantes dessas semanas foi a expulsão, por ingerência, de três diplomatas norte-americanos. O histórico de violação pelos Estados Unidos da soberania de países ao redor do mundo é notória e documentada. Baseia-se na doutrina datada de 1845 do Destino Manifesto, uma filosofia que expressa a crença de que o povo dos Estados Unidos foi eleito por Deus para comandar o mundo, sendo o expansionismo geopolítico norte-americano apenas uma expressão da vontade divina.

Para derrocar governos que não aderem a suas políticas imperialistas, os Estados Unidos executam, em vários países, um padrão que consiste em desmoralizar o adversário, distanciando-o da população; sugerir que o governo não pode governar de maneira eficaz; dividir a população; negar legitimidade ao governo; e, valendo-se dos meios de comunicação, da propaganda, de boicotes e sabotagens, gerar um levante que derrube o presidente em questão. Como os golpes de Estado com intervenção militar estão fora de moda, a Casa Branca, o Departamento de Estado e a CIA abraçaram a doutrina do “golpe brando”, exposta no ensaio intitulado Da Ditadura à Democracia, de autoria de Gene Sharp, da Instituição Albert Einstein, que descreve 198 métodos para derrocar governos mediante “golpes suaves” e expõe a estratégia dos cinco passos para sua execução.

A primeira etapa é promover ações não violentas para gerar um clima de mal-estar na sociedade, destacando-se entre elas, ainda que caluniosas, denúncias de corrupção, promoção de intrigas ou divulgação de falsos rumores. A segunda consiste em desenvolver intensas campanhas de “defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos, acompanhadas de acusações de tirania e totalitarismo contra o governo no poder. A terceira centra-se na luta ativa por reivindicações políticas e sociais e na manipulação do coletivo para que empreenda manifestações e protestos violentos, ameaçando as instituições. A quarta etapa passa por executar operações de guerra psicológica e desestabilização do governo, criando um clima de “ingovernabilidade”. A quinta e última tem por objetivo forçar a renúncia do presidente, mediante revoltas de rua, para controlar as instituições, enquanto se mantém a pressão na rua. Paralelamente, prepara-se o terreno para uma intervenção militar, enquanto se desenvolve uma batalha interna (ou uma guerra civil) prolongada para conseguir o isolamento internacional do país.

Em novembro de 2013, o presidente Maduro, consciente do que se tramava, afirmou que setores da oposição, com financiamento dos Estados Unidos e respaldo da elite empresarial e dos meios de comunicação, com apoio logístico da CIA, planejavam um golpe brando, estratégia que se implementou ativamente na Venezuela.

Recordemos um pouco da história recente. Em outubro de 2012, Chávez, já bastante doente, não podendo percorrer o país na campanha, ganha de Capriles, que visitou estado por estado, por 11 pontos percentuais de diferença. Em 8 de dezembro, Chávez anuncia Maduro como o candidato da Revolução caso algo lhe ocorresse. Chega à fase terminal de sua doença deixando Maduro como presidente interino. A oposição, vislumbrando a morte de Chávez e a possibilidade de empalmar o poder numa primeira eleição sem sua presença, desata uma impiedosa campanha na base do “Maduro não é Chávez”. Maduro ganha as eleições de abril de 2013 por estreita margem. Capriles não reconhece o resultado, alega fraude e passa a considerá-lo um presidente ilegítimo. A campanha de desqualificação de Maduro e de seus ministros, sempre apoiada pela grande mídia local e internacional, prossegue meses afora. Somam-se então uma guerra psicológica e uma intensa sabotagem econômica, com alta inescrupulosa de preços, desabastecimento, açambarcamento, visando ao caos e à desestabilização do governo. As eleições municipais marcadas para 8 de dezembro passam a ser consideradas pela oposição como um plebiscito.

Capriles percorre o país proclamando que se Maduro perder as eleições será o fim de seu governo. Contudo, Maduro ganha as eleições por margem de votos globais superior a 10%, com a conquista de 76% das prefeituras. Setores radicais da oposição se mostram inconformados. Se pela via constitucional não conseguem derrubar o presidente, que seja pela via insurrecional. Em 23 de janeiro, Leopoldo López e Maria Corina Machado chamam seus seguidores às ruas. Sob o lema “La Salida” pretendem derrocar o governo e, segundo um plano adrede e cuidadosamente preparado, soltam suas hordas fascistas.

Há uma campanha permanente para apresentar a Venezuela como um país no caos, governado por um tirano em plena ditadura, quando na verdade todas as liberdades estão garantidas e em pleno exercício. O que, sim, existe é um processo de reafirmação da nova independência, da construção de novos modelos econômicos e culturais, uma nova mentalidade que está se impondo. Chávez, ao longo de catorze anos, formou e educou uma forte consciência coletiva, política e ideológica. Mesmo diante de imensas dificuldades, o povo venezuelano é capaz de entender a situação, os interesses em jogo, e se mantém fiel no apoio à Revolução Bolivariana. Trata-se de uma revolução sui generis de caráter socialista. Seu êxito, segundo Washington, as oligarquias locais e internacionais e a direita em geral, consistiria num “mau exemplo” para as demais nações da região. E essa é a essência e o ponto fulcral de toda a problemática a deixar nítidas as posições dos lados em disputa.

Nicolás Maduro tem se mostrado um líder à altura dos acontecimentos. Firme, corajoso e também hábil. Vai à televisão, aos jornais, à Telesur, convoca atos públicos e no exercício da liberdade de expressão expõe com clareza e veemência seus pontos de vista sobre os mais variados temas. Não tarda nem vacila em fazê-lo toda vez que recebe injustas agressões ou que um acontecimento importante o obrigue a se manifestar. Mas também sabe o momento de conclamar à paz e à tranquilidade, atrair adversários, estabelecer diálogos e de conquistar o apoio da quase totalidade dos países da região em favor de sua luta.

Tudo leva a crer que uma vez mais, nesse tumultuado caminho percorrido pela Revolução Bolivariana nos últimos quinze anos, ela sai vitoriosa. Resta enfrentar e resolver problemas reais que angustiam a população e servem de caldo de cultura à reação: inflação, desabastecimento, segurança pública. E romper com a “maldição do petróleo”, levando o país a abandonar o tradicional rentismo, construir uma base industrial e garantir a segurança alimentar da população. Isso poderá exigir duras medidas no campo econômico e, por conseguinte, necessitará de um amplo leque de apoio, para além das forças chavistas.

*Max Altman é membro da Secretaria de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores 
Fonte: Vermelho

Ações brasileiras para erradicar pobreza são destaque mundial

As experiências brasileiras com programa de transferências de renda – Bolsa Família – e o Cadastro Único são, para a representante do Banco Mundial, Margaret Grosh, a razão pelo crescente interesse internacional pelo Brasil. Ela participa do Encontro da Comunidade de Aprendizagem em Transferência Monetária da África, em Fortaleza (CE), que termina nesta sexta-feira (14).  


“O principal motivo do sucesso brasileiro é o compromisso que o governo tem com os programas sociais”, apontou a economista especializada em desenvolvimento humano na América Latina e Caribe. Para Margaret, o Cadastro Único é peça fundamental da tecnologia voltada para a assistência social e o mais completo registro da área já implantado no mundo. 

Outra razão para o interesse internacional, segundo Margaret, é a extensão do território e o modelo federativo brasileiro. As variações necessárias para adaptar os programas às realidades regionais tornam o caso do Brasil um prato cheio para nações que desejam implantar ou aperfeiçoar seus aparelhos de desenvolvimento social.

O Banco Mundial realiza o Encontro da Comunidade de Aprendizado em Transferências Monetárias na África, em Fortaleza, para promover o conhecimento e compartilhamento de experiências nas áreas de assistência social, transferência de renda e de inclusão produtiva para integrantes de governos de países africanos, que participam da Comunidade de Aprendizagem dos Países Africanos (CoP).

A CoP é formada por 29 países e se encontra presencialmente a cada dois anos, com o objetivo de consolidar o grupo como uma comunidade, promover o diálogo e o trabalho em rede, discutir temas relevantes e estabelecer as próximas ações.

Da Redação em Brasília - com PT na Câmara

quinta-feira, 13 de março de 2014

Saul Leblon: 50 anos de um comício que ainda fala ao Brasil

A derrubada violenta de Jango em 1964 foi antecedida, a exemplo do que se fez com Vargas dez anos antes, e da tentativa frustrada contra Lula, 41 depois, de uma campanha midiática de ódio e acusações de corrupção contra o seu governo e a sua pessoa. 

Por Saul Leblon*, na Carta Maior


As motivações também se assemelhavam.

E não eram aquelas estampadas pelo alarido moralista.

O governo Jango, como o de Vergas --e o ciclo atual do PT— buscava revestir o desenvolvimento brasileiro de travas de soberania e direitos sociais inaceitáveis pelo dinheiro graúdo de ontem e de hoje.

Jango ensaiava expandir o alicerce varguista, ao qual servira como ministro do Trabalho, com o impulso a reformas de base dotadas de expressivo apoio popular.

Nos jornais, no entanto, o clima era adverso.

A crispação editorial desenhava um Brasil aos cacos, uma sociedade a caminho do esfarelamento econômico e social.

O jogral do desgoverno, do desabastecimento e da infiltração estrangeira e marxista servia o medo no café da manhã; guarnecia o jantar com a insegurança do dia seguinte.

Pesquisas do Ibope sonegadas então à opinião pública, e assim ocultadas por mais de 40 anos, contradiziam o bombardeio diuturno das expectativas veiculadas pelos órgãos de comunicação.

A mídia agia ostensivamente como parte interessada no assalto ao poder que interrompeu um governo democrático, instaurou uma ditadura, suspendeu as liberdades e garantias individuais, sufocou o debate das reformas estruturais requeridas pelo desenvolvimento.

Para isso denegriu, mentiu, prendeu, matou, torturou e censurou.

Foi dela a iniciativa de convocar o pânico e a mentira e com eles sabotar o debate plural sobre o passo seguinte da história brasileira, cercando-a de interditos ideológicos e moralistas.

Ontem como hoje, seu papel foi decisivo para levar a classe média a incorporar um discernimento preconceituoso e golpista à sua visão do desenvolvimento brasileiro.

E mesmo assim, só uma parte dela.

Os dados coletados pelo Ibope, em enquetes de opinião realizadas às vésperas do golpe (e hoje armazenados no Arquivo Edgar Leuenroth, da Unicamp), mostram uma realidade distinta daquela cristalizada na narrativa hegemônica.

O conjunto assume incontornável atualidade quando cotejado com a ênfase predominante no aparato midiático do Brasil, Argentina ou da Venezuela nos dias que correm.

Pesquisas levadas às ruas entre os dias 20 e 30 de março de 1964, quando a democracia era sofregamente tangida ao matadouro pelos que bradavam em sua defesa, mostram que:

a) 69% dos entrevistados avaliavam o governo Jango como: ótimo (15%); bom (30%) e regular (24%).

b) Apenas 15% o consideravam ruim ou péssimo, fazendo eco do martelete midiático.

c) quase 50% ( 49,8%) cogitavam votar em Jango, caso ele se candidatasse à reeleição em 1965 (41,8% rejeitavam essa opção).

d) 59% apoiavam as medidas anunciadas pelo Presidente na famosa sexta-feira, 13 de março , quando assinaria decretos que expropriavam terras às margens das rodovias para fins de reforma agrária, nacionalizaria refinarias, comprometia-se com a reforma urbana, fiscal e educacional.

As pesquisas sigilosas compõem agora o desconcertante contrapelo das manchetes golpistas que podem ser acessadas em modernos bancos de dados, ou lidas nas edições correntes dos mesmos veículos, escritos e dirigidos pela mesma cepa que urdiu a fraude informativa de 1964.

Um jornalismo que oculta elementos da equação política e econômica, exacerba adversidades, manipula o debate e interdita as soluções requeridas pelo desenvolvimento –a exemplo do que fez com a agenda das reformas de base em 1964. 

Em editorial escrito com a tintura do cinismo oportunista, um dos centuriões daquelas jornadas, o diário O Globo, fez recentemente a autocrítica esperta de sua participação no episódio.

Como certos confidentes da ditadura, ora promovidos a historiadores do período, o diário dos Marinhos escusa-se se no acessório para justificar a violência golpista como inevitável diante do quadro extremado: o golpe viria de qualquer jeito, um lado ou de outro, sugere-se.

Se havia extremismo em bolsões à esquerda, a verdade é que a incerteza social e a rejeição ao governo, como se vê pela pesquisa do Ibope, foram exacerbadas deliberadamente para gerar o clima de animosidade insanável e legitimar assim a ruptura institucional.

As semelhanças com a engrenagem em movimento avultam aos olhos menos distraídos.

Esse é o ponto a reter.

Ele faz da rememoração do discurso que completa 50 anos nesta 5ª feira, um mirante oportuno para enxergar não apenas o passado.

Mas a partir dele arguir interrogações de latejante urgência no presente.

Em que medida a reordenação de um ciclo de desenvolvimento pode ocorrer dentro da democracia quando esta lhe sonega os meios para o debate e o espaço político para construção das maiorias requeridas ao passo seguinte de uma nação?

O Brasil dos anos 60 vivia, como agora, o esgotamento de um ciclo e o difícil parto do seguinte.

As reformas de base – a agrária, a urbana, a tributária, a política, a educacional — visavam destravar potencialidades e recursos de um sistema exaurido.

O impulso industrializante de Vargas, dos anos 30 a meados dos anos 50, e o do consumo , fomentado por Juscelino, mostravam claros sinais de esgotamento.

Trincas marmorizavam todo tecido social e econômico. Os remendos já não sustentavam o corpo de uma sociedade que reclamava espaço para avançar.

Esgarçamentos eram magnificados pelos guardiães da estabilidade, a exemplo dos que agora clamam pelo rebaixamento da nota do Brasil junto às agências de risco.

O déficit público latejava entre as urgências do desenvolvimento e as disponibilidades para financiá-lo sem uma reforma tributária corajosa.

O PIB anêmico e a inflação renitente completavam a encruzilhada de um sistema econômico a requerer um aggiornamento estrutural.

O conjunto tinha como arremate a guerra fria, exacerbada na América Latina pela vitória da revolução cubana, que desde 1959 irradiava uma alternativa à luta pelo desenvolvimento regional.

O efeito na vida cotidiana era enervante. Como o seria no Chile, nove anos depois; como o é hoje, em certa medida, na Venezuela de Maduro; ou na Argentina de Cristina.

As reformas progressistas propostas por Jango estavam longe de caracterizar o alvorecer comunista alardeado diariamente nas manchetes do udenismo midiático.

O que se buscava era superar entraves --e privilégios-- de uma máquina econômica entrevada em suas próprias contradições.

Jango pretendia associar a isso um salto de cidadania e justiça social, ampliando o acesso à educação e aos direitos no campo e nas cidades para dar um novo estirão ao mercado interno.

Diante do salto ensaiado, convocada a democracia a discutir as grandes avenidas do futuro brasileiro, os centuriões da legalidade optaram pelo golpe.

Deram ao escrutínio popular um atestado de incapacidade para formar os grandes consensos indispensáveis à estabilidade e duração de um ciclo de expansão produtiva e florescimento democrático.

Os ecos persistentes desse período encerram uma lição negligenciada por aqueles que ainda encaram o binômio 'mídia e regulação' como um ruído contornável com a barganha de indulgências junto a um aparato que em última instância deseja-lhes a mesma sorte de Jango.

A verdade é que nem mesmo um programa moderado de reformas e oxigenação social como o da coalizão centrista liderada pelo PT é tolerável.

É imperativo iluminar a seta do tempo que não se quebrou na atualidade das mudanças estruturais reclamadas pelo país.

Em 13 de março de 1964, Jango pronunciaria o discurso memorável, que daria a essa agenda o lugar que ela ainda cobra na história brasileira. E que a narrativa conservadora insiste em lhe sonegar.

Leia, a seguir, a íntegra do comício pronunciado pelo Presidente João Goulart, na Central do Brasil, no dia 13 de março de 1964

“Devo agradecer em primeiro lugar às organizações promotoras deste comício, ao povo em geral e ao bravo povo carioca em particular, a realização, em praça pública, de tão entusiasta e calorosa manifestação. Agradeço aos sindicatos que mobilizaram os seus associados, dirigindo minha saudação a todos os brasileiros que, neste instante, mobilizados nos mais longínquos recantos deste país, me ouvem pela televisão e pelo rádio.

Dirijo-me a todos os brasileiros, não apenas aos que conseguiram adquirir instrução nas escolas, mas também aos milhões de irmãos nossos que dão ao brasil mais do que recebem, que pagam em sofrimento, em miséria, em privações, o direito de ser brasileiro e de trabalhar sol a sol para a grandeza deste país.

Presidente de 80 milhões de brasileiros, quero que minhas palavras sejam bem entendidas por todos os nossos patrícios.

Vou falar em linguagem que pode ser rude, mas é sincera sem subterfúgios, mas é também uma linguagem de esperança de quem quer inspirar confiança no futuro e tem a coragem de enfrentar sem fraquezas a dura realidade do presente.

Aqui estão os meus amigos trabalhadores, vencendo uma campanha de terror ideológico e sabotagem, cuidadosamente organizada para impedir ou perturbar a realização deste memorável encontro entre o povo e o seu presidente, na presença das mais significativas organizações operárias e lideranças populares deste país.

Chegou-se a proclamar, até, que esta concentração seria um ato atentatório ao regime democrático, como se no Brasil a reação ainda fosse a dona da democracia, e a proprietária das praças e das ruas. Desgraçada a democracia se tiver que ser defendida por tais democratas.

Democracia para esses democratas não é o regime da liberdade de reunião para o povo: o que eles querem é uma democracia de povo emudecido, amordaçado nos seus anseios e sufocado nas suas reinvindicações.

A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia antipovo, do anti-sindicato, da anti-reforma, ou seja, aquela que melhor atende aos interesses dos grupos a que eles servem ou representam.

A democracia que eles querem é a democracia para liquidar com a Petrobrás; é a democracia dos monopólios privados, nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício.

Ainda ontem, eu afirmava, envolvido pelo calor do entusiasmo de milhares de trabalhadores no Arsenal da Marinha, que o que está ameaçando o regime democrático neste País não é o povo nas praças, não são os trabalhadores reunidos pacificamente para dizer de suas aspirações ou de sua solidariedade às grandes causas nacionais. Democracia é precisamente isso: o povo livre para manifestar-se, inclusive nas praças públicas, sem que daí possa resultar o mínimo de perigo à segurança das instituições.

Democracia é o que o meu governo vem procurando realizar, como é do seu dever, não só para interpretar os anseios populares, mas também conquistá-los pelos caminhos da legalidade, pelos caminhos do entendimento e da paz social.

Não há ameaça mais séria à democracia do que desconhecer os direitos do povo; não há ameaça mais séria à democracia do que tentar estrangular a voz do povo e de seus legítimos líderes, fazendo calar as suas mais sentidas reinvindicações.

Estaríamos, sim, ameaçando o regime se nos mostrássemos surdos aos reclamos da Nação, que de norte a sul, de leste a oeste levanta o seu grande clamor pelas reformas de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será como complemento da abolição do cativeiro para dezenas de milhões de brasileiros que vegetam no interior, em revoltantes condições de miséria.

Ameaça à democracia não é vir confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é empulhar o povo explorando seus sentimentos cristãos, mistificação de uma indústria do anticomunismo, pois tentar levar o povo a se insurgir contra os grandes e luminosos ensinamentos dos últimos Papas que informam notáveis pronunciamentos das mais expressivas figuras do episcopado brasileiro.

O inolvidável Papa João XXIII é quem nos ensina que a dignidade da pessoa humana exige normalmente como fundamento natural para a vida, o direito ao uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação fundamental de conceder uma propriedade privada a todos.

É dentro desta autêntica doutrina cristã que o governo brasileiro vem procurando situar a sua política social, particurlamente a que diz respeito à nossa realidade agrária.

O cristianismo nunca foi o escudo para os privilégios condenados pelos Santos Padres. Nem os rosários podem ser erguidos como armas contra os que reclamam a disseminação da propriedade privada da terra, ainda em mãos de uns poucos afortunados.

Àqueles que reclamam do Presidente de República uma palavra tranqüilizadora para a Nação, o que posso dizer-lhes é que só conquistaremos a paz social pela justiça social.

Perdem seu tempo os que temem que o governo passe a empreender uma ação subversiva na defesa de interesses políticos ou pessoais; como perdem igualmente o seu tempo os que esperam deste governo uma ação repressiva dirigida contra os interesses do povo. Ação repressiva, povo carioca, é a que o governo está praticando e vai amplia-la cada vez mais e mais implacavelmente, assim na Guanabara como em outros estados contra aqueles que especulam com as dificuldades do povo, contra os que exploram o povo e que sonegam gêneros alimentícios e jogam com seus preços.

Ainda ontem, trabalhadores e povo carioca, dentro da associações de cúpula de classes conservadoras, levanta-se a voz contra o Presidente pelo crime de defender o povo contra aqueles que o exploram nas ruas, em seus lares, movidos pela ganância.

Não tiram o sono as manifestações de protesto dos gananciosos, mascarados de frases patrióticas, mas que, na realidade, traduzem suas esperanças e seus propósitos de restabelecer a impunidade para suas atividades anti-sociais.

Não receio ser chamado de subversivo pelo fato de proclamar, e tenho proclamado e continuarei a proclamando em todos os recantos da Pátria – a necessidade da revisão da Constituição, que não atende mais aos anseios do povo e aos anseios do desenvolvimento desta Nação.

Essa Constituição é antiquada, porque legaliza uma estrutura sócio-econômica já superada, injusta e desumana; o povo quer que se amplie a democracia e que se ponha fim aos privilégios de uma minoria; que a propriedade da terra seja acessível a todos; que a todos seja facultado participar da vida política através do voto, podendo votar e ser votado; que se impeça a intervenção do poder econômico nos pleitos eleitorais e seja assegurada a representação de todas as correntes políticas, sem quaisquer discriminações religiosas ou ideológicas.

Todos têm o direito à liberdade de opinião e de manifestar também sem temor o seu pensamento. É um princípio fundamental dos direitos do homem, contido na Carta das Nações Unidas, e que temos o dever de assegurar a todos os brasileiros.

Está nisso o sentido profundo desta grande e incalculável multidão que presta, neste instante, manifestação ao Presidente que, por sua vez, também presta conta ao povo dos seus problemas, de suas atitudes e das providências que vem adotando na luta contra forças poderosas, mas que confia sempre na unidade do povo, das classes trabalhadoras, para encurtar o caminho da nossa emancipação.

É apenas de lamentar que parcelas ainda ponderáveis que tiveram acesso à instrução superior continuem insensíveis, de olhos e ouvidos fechados à realidade nacional.

São certamente, trabalhadores, os piores surdos e os piores cegos, porque poderão, com tanta surdez e tanta cegueira, ser os responsáveis perante a História pelo sangue brasileiro que possa vir a ser derramado, ao pretenderem levantar obstáculos ao progresso do Brasil e à felicidade de seu povo brasileiro.

De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo continuarei fazendo para que o processo democrático siga um caminho pacífico, para que sejam derrubadas as barreiras que impedem a conquista de novas etapas do progresso.

E podeis estar certos, trabalhadores, de que juntos o governo e o povo – operários , camponeses, militares, estudantes, intelectuais e patrões brasileiros, que colocam os interesses da Pátria acima de seus interesses, haveremos de prosseguir de cabeça erguida, a caminhada da emancipação econômica e social deste país.

O nosso lema, trabalhadores do Brasil, é “progresso com justiça, e desenvolvimento com igualdade”.

A maioria dos brasileiros já não se conforma com uma ordem social imperfeita, injusta e desumana. Os milhões que nada têm impacientam-se com a demora, já agora quase insuportável, em receber os dividendos de um progresso tão duramente construído, mas construído também pelos mais humildes.

Vamos continuar lutando pela construção de novas usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de mais fábricas, por novas escolas, por mais hospitais para o nosso povo sofredor; mas sabemos que nada disso terá sentido se o homem não for assegurado o direito sagrado ao trabalho e uma justa participação nos frutos deste desenvolvimento.

Não, trabalhadores; sabemos muito bem que de nada vale ordenar a miséria, dar-lhe aquela aparência bem comportada com que alguns pretendem enganar o povo. Brasileiros, a hora é das reformas de estrutura, de métodos, de estilo de trabalho e de objetivo. Já sabemos que não é mais possível progredir sem reformar; que não é mais possível admitir que essa estrutura ultrapassada possa realizar o milagre da salvação nacional para milhões de brasileiros que da portentosa civilização industrial conhecem apenas a vida cara, os sofrimentos e as ilusões passadas.

O caminho das reformas é o caminho do progresso pela paz social. Reformar é solucionar pacificamente as contradições de uma ordem econômica e jurídica superada pelas realidades do tempo em que vivemos.


Trabalhadores, acabei de assinar o decreto da SUPRA com o pensamento voltado para a tragédia do irmão brasileiro que sofre no interior de nossa Pátria. Ainda não é aquela reforma agrária pela qual lutamos.

Ainda não é a reformulação de nosso panorama rural empobrecido.

Ainda não é a carta de alforria do camponês abandonado.

Mas é o primeiro passo: uma porta que se abre à solução definitiva do problema agrário brasileiro.

O que se pretende com o decreto que considera de interesse social para efeito de desapropriação as terras que ladeiam eixos rodoviários, leitos de ferrovias, açudes públicos federais e terras beneficiadas por obras de saneamento da União, é tornar produtivas áreas inexploradas ou subutilizadas, ainda submetidas a um comércio especulativo, odioso e intolerável.

Não é justo que o benefício de uma estrada, de um açude ou de uma obra de saneamento vá servir aos interesses dos especuladores de terra, quese apoderaram das margens das estradas e dos açudes. A Rio-Bahia, por exemplo, que custou 70 bilhões de dinheiro do povo, não deve bemeficiar os latifundiários, pela multiplicação do valor de suas propriedades, mas sim o povo.

Não o podemos fazer, por enquanto, trabalhadores, como é de prática corrente em todos os países do mundo civilizado: pagar a desapropriação de terras abandonadas em títulos de dívida pública e a longo prazo.

Reforma agrária com pagamento prévio do latifundio improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária. É negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos interesses do povo brasileiro. Por isso o decreto da SUPRA não é a reforma agrária.

Sem reforma constitucional, trabalhadores, não há reforma agrária. Sem emendar a Constituição, que tem acima de dela o povo e os interesses da Nação, que a ela cabe assegurar, poderemos ter leis agrárias honestas e bem-intencionadas, mas nenhuma delas capaz de modificações estruturais profundas.

Graças à colaboração patriótica e técnica das nossas gloriosas Forças Armadas, em convênios realizados com a SUPRA, graças a essa colaboração, meus patrícios espero que dentro de menos de 60 dias já comecem a ser divididos os latifúndios das beiras das estradas, os latifúndios aos lados das ferrovias e dos açudes construídos com o dinheiro do povo, ao lado das obras de saneamento realizadas com o sacrifício da Nação. E, feito isto, os trabalhadores do campo já poderão, então, ver concretizada, embora em parte, a sua mais sentida e justa reinvindicação, aquela que lhe dará um pedaço de terra para trabalhar, um pedaço de terra para cultivar. Aí, então, o trabalhador e sua família irão trabalhar para si próprios, porque até aqui eles trabalham para o dono da terra, a quem entregam, como aluguel, metade de sua produção. E não se diga, trabalhadores, que há meio de se fazer reforma sem mexer a fundo na Constituição. Em todos os países civilizados do mundo já foi suprimido do texto constitucional parte que obriga a desapropriação por interesse social, a pagamento prévio, a pagamento em dinheiro.

No Japão de pós-guerra, há quase 20 anos, ainda ocupado pelas forças aliadas vitoriosas, sob o patrocínio do comando vencedor, foram distribuídos dois milhões e meio de hectares das melhores terras do país, com indenizações pagas em bônus com 24 anos de prazo, juros de 3,65% ao ano. E quem é que se lembrou de chamar o General MacArthur de subversivo ou extremista?

Na Itália, ocidental e democrática, foram distribuídos um milhão de hectares, em números redondos, na primeira fase de uma reforma agrária cristã e pacífica iniciada há quinze anos, 150 mil famílias foram beneficiadas.

No México, durante os anos de 1932 a 1945, foram distribuídos trinta milhões de hectares, com pagamento das indenizações em títulos da dívida pública, 20 anos de prazo, juros de 5% ao ano, e desapropriação dos latifúndios com base no valor fiscal.

Na Índia foram promulgadas leis que determinam a abolição da grande propriedade mal aproveitada, transferindo as terras para os camponeses.

Essas leis abrangem cerca de 68 milhões de hectares, ou seja, a metade da área cultivada da Índia. Todas as nações do mundo, independentemente de seus regimes políticos, lutam contra a praga do latifúndio improdutivo.

Nações capitalistas, nações socialistas, nações do Ocidente, ou do Oriente, chegaram à conclusão de que não é possível progredir e conviver com o latifúndio.

A reforma agrária não é capricho de um governo ou programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de todos os povos do mundo. Aqui no Brasil, constitui a legenda mais viva da reinvindicação do nosso povo, sobretudo daqueles que lutaram no campo.

A reforma agrária é também uma imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para sobreviver.

Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas populações mais pobres vestem farrapos e andam descalças, porque não tem dinheiro para comprar.

Assim, a reforma agrária é indispensável não só para aumentar o nível de vida do homem do campo, mas também para dar mais trabalho às industrias e melhor remuneração ao trabalhador urbano.

Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa vida social e econômica, para que o país possa progredir, em sua indústria e no bem-estar do seu povo.

Como garantir o direito de propriedade autêntico, quando dos quinze milhões de brasileiros que trabalham a terra, no Brasil, apenas dois milhões e meio são proprietários?

O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho da reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em todos os países desenvolvidos do mundo. É uma etapa de progresso que precisamos conquistar e que haveremos de conquistar.

Esta manifestação deslumbrante que presenciamos é um testemunho vivo de que a reforma agrária será conquistada para o povo brasileiro. O próprio custo daprodução, trabalhadores, o próprio custo dos gêneros alimentícios está diretamente subordinado às relações entre o homem e a terra. Num país em que se paga aluguéis da terra que sobem a mais de 50 por cento da produção obtida daquela terra, não pode haver gêneros baratos, não pode haver tranquilidade social. No meu Estado, por exemplo, o Estado do deputado Leonel Brizola, 65% da produção de arroz é obtida em terras alugadas e o arrendamento ascende a mais de 55% do valor da produção. O que ocorre no Rio Grande é que um arrendatário de terras para plantio de arroz paga, em cada ano, o valor total da terra que ele trabahou para o proprietário. Esse inquilinato rural desumano é medieval é o grande responsável pela produção insuficiente e cara que torna insuportável o custo de vida para as classes populares em nosso país.

A reforma agrária só prejudica a uma minoria de insensíveis, que deseja manter o povo escravo e a Nação submetida a um miseravel padrão de vida.

E é claro, trabalhadores, que só se pode iniciar uma reforma agrária em terras economicamente aproveitáveis. E é claro que não poderíamos começar a reforma agrária, para atender aos anseios do povo, nos Estados do Amazonas ou do Pará. A reforma agrária deve ser iniciada nas terras mais valorizadas e ao lado dos grandes centros de consumo, com transporte fácil para o seu escoamento.

Governo nenhum, trabalhadores, povo nenhum, por maior que seja seu esforço, e até mesmo o seu sacrifício, poderá enfrentar o monstro inflacionário que devora os salários, que inquieta o povo assalariado, se não form efetuadas as reformas de estrutura de base exigidsa pelo povo e reclamadas pela Nação.

Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque seu objetivo único e exclusivo é abrir o caminho para a solução harmônica dos problemas que afligem o nosso povo.

Não me animam, trabalhadores – e é bom que a nação me ouça – quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes beneficiários das reformas serão, acima de todos, o povo brasileiro e os governos que me sucederem. A eles, trabalhadores, desejo entregar uma Nação engrandecida, emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter resolvido mais uma vez, pacificamente, os graves problemas que a História nos legou. Dentro de 48 horas, vou entregar à consideração do Congresso Nacional a mensagem presidencial deste ano.

Nela, estão claramente expressas as intenções e os objetivos deste governo. Espero que os senhres congressistas, em seu patriotismo, compreendam o sentido social da ação governamental, que tem por finalidade acelerar o progresso deste país e assegurar aos brasileiros melhores condições de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do entendimento, isto é pelo caminho reformista.

Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse, também, em nome do povo brasileiro, em nome destas 150 ou 200 mil pessoas que aqui estão, caloroso apelo ao Congresso Nacional para que venha ao encontro das reinvindicações populares, para que, em seu patriotismo, sinta os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e democraticamente para melhores dias. Mas também, trabalhadores, quero referir-me a um outro ato que acabo de assinar, interpretando os sentimentos nacionalistas destes país. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta grande festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias particulares.

A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a partir deste instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga, Manguinhos, Amazonas, e Destilaria Rio Grandense passam a pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio nacional.

Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidadosos elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos, procurei ser fiel ao espírito da Lei n. 2.004, lei que foi inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um brasileiro que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.

Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública, o decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo particulares, desejo prestar homenagem de respeito àquele que sempre esteve presente nos sentimentos do nosso povo, o grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.

O imortal e grande patriota Getúlio Vargas tombou, mas o povo continua a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particurlamente, vivo hoje momento de profunda emoção ao poder dizer que, com este ato, soube interpretar o sentimento do povo brasileiro.

Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar medidas como esta, da maior significação para o desenvolvimento do país e que habilita o Brasil a aproveitar melhor as suas riquezas minerais, especialmente as riquezas criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre presente nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um governo que pratica atos como estes, e também para mostrar às forças reacionárias que há de continuar a sua caminhada, no rumo da emancipação nacional.

Na mensagem que enviei à consideração do Congresso Nacional, estão igualmente consignadas duas outras reformas que o povo brasileiro reclama, porque é exigência do nosso desenvolvimento e da nossa democracia. Refiro-me à reforma eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os brasileiros maiores de 18 anos ajudar a decidir dos seus destinos, que permita a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento do país a influir nos destinos gloriosos do Brasil. Nesta reforma, pugnamos pelo princípio democrático, princípio democrático fundamental, de que todo alistável deve ser também elegível.

Também está consignada na mensagem ao Congresso a reforma universitária, reclamada pelos estudantes brasileiros. Pelos universitários, classe que sempre tem estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos populares nacionalistas.

Ao lado dessas medidas e desses decretos, o governo continua examinando outras providências de fundamental importância para a defesa do povo, especialmente das classes populares.

Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço extorsivo dos apartamentos e residências desocupados, preços que chegam a afrontar o povo e o Brasil, oferecidos até mediante o pagamento em dólares. Apartamento no Brasil só pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do povo e a moeda deste país. Estejam tranqüilos que dentro em breve esse decreto será uma realidade.

E realidade há de ser também a rigorosa e implacável fiscalização para seja cumprido. O governo, apesar dos ataques que tem sofrido, apesar dos insultos, não recuará um centímetro sequer na fiscalização que vem exercendo contra a exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que ajude o governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são também exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitarem a lei, explorando o povo – não interessa o tamanho de sua fortuna, nem o tamanho de seu poder, esteja ele em Olaria ou na Rua do Acre – hão de responder, perante a lei, pelo seu crime.

Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado com seu apoio e o calor de sua solidariedade, posso afirmar que suas reinvindicações justas estão sendo objeto de estudo final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que permanentemente cumprem o seu para com o país.

Ao encerrar, trabalhadores, quero dizer que me sinto reconfortado e retemperado para enfrentar a luta que tanto maior será contra nós quanto mais perto estivermos do cumprimento de nosso dever. À medida que esta luta apertar, sei que o povo também apertará sua vontade contra aqueles quenão reconhecem os direitos populares, contra aqueles que exploram o povo e a Nação.

Sei das reações que nos esperam, mas estou tranqüilo, acima de tudo porque sei que o povo brasileiro já está amadurecido, já tem consciência da sua força e da sua unidade, e não faltará com seu apoio às medidas de sentido popular e nacionalista.

Quero agradecer, mais uma vez, esta extraordinária manifestação, em que os nossos mais significativos líderes populares vieram dialogar com o povo brasileiro, especialmente com o bravo povo carioca, a respeito dos problemas que preocupam a Nação e afligem todos os nossos patrícios. Nenhuma força será capaz de impedir que o governo continue a assegurar absoluta liberdade ao povo brasileiro. E, para isto, podemos declarar, com orgulho, que contamos com a compreensão e o patriotismo das bravas e gloriosas Forças Armadas da Nação.

Hoje, com o alto testemunho da Nação e com a solidariedade do povo, reunido na praça que só ao povo pertence, o governo, que é também o povo e que também só ao povo pertence, reafirma os seus propósitos inabaláveis de lutar com todas as suas forças pela reforma da sociedade brasileira. Não apenas pela reforma agrária, mas pela reforma tributária, pela reforma eleitoral ampla, pelo voto do analfabeto, pela elegibilidade de todos os brasileiros, pela pureza da vida democrática, pela emancipação econômica, pela justiça social e pelo progresso do Brasil.

*Saul Leblon é jornalista

**Atualização de nota publicada neste blog em novembro de 2013.