quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Avante! e L'Humanité: as grandiosas festas comunistas na Europa

José Reinaldo Carvalho, secretário de Relações Internacionais do PCdoB, esteve recentemente em Portugal e na França para participar das festas dos jornais Avante!, do Partido Comunista Português, e do L'Humanité, órgão do Partido Comunista Francês. Em entrevista ao Portal Vermelho, ele fala da importância das duas festas no contexto político-cultural europeu.


Público presente ao comício de encerramento da festa do Avante! 2015Público presente ao comício de encerramento da festa do Avante! 2015
O que são esses dois eventos de dois dos maiores jornais comunistas da Europa?

O objetivo da viagem foi participar das festas de dois dos mais importantes jornais de partidos comunistas do mundo, no atual quadro do movimento comunista internacional. O primeiro destino foi a Festa do Avante!, jornal do Partido Comunista Português.

A Festa do Avante! foi fascinante, contagiante, porque a gente via o transbordamento da alegria, de combatividade, de espírito militante em todas as pessoas com quem deparávamos, tanto do público quanto dos militantes.

A Festa do Avante! é o maior acontecimento político e cultural de Portugal. Não há no país semelhante acontecimento desse caráter, com essa dimensão. É uma festa que expressa a força e o entusiasmo da juventude portuguesa e da juventude comunista e militância do PCP.

Uma característica muito saliente da Festa e que acho que é exemplar para todo o movimento comunista e para nós também é que a festa é construída com trabalho militante e voluntário. Durante meses os militantes do PCP e da Juventude constroem as estruturas, os estandes que abrigarão os comitês regionais, tudo com trabalho voluntário.

Militante do PCP pinta estande da festa do Avante!
Militantes dedicam dias de suas férias para trabalhar na Festa. Entregam dias de seu descanso, de seu lazer, para ali trabalhar. Montam uma estrutura enorme numa quinta – um sítio de propriedade do partido há já duas décadas. A Festa de 2016 será maior, já que o partido adquiriu recentemente uma área vizinha e ampliou o terreno.

Essa festa, por ser um grandioso evento, tem grande participação?

Evidentemente que sim. A Festa do Avante! é equivalente a três vezes o público do festival de rock realizado agora no Rio de Janeiro. Durante três dias, centenas de milhares de pessoas vão à festa com ingresso pago. São centenas de milhares de pessoas que pagam ingresso para participar da festa.

A Festa consiste de centenas de atividades, de debates, de concertos musicais, de jogos – porque tem muitas competições esportivas –, de atividades lúdicas para as crianças e, por isso, ela é política e cultural. Os camaradas são capazes de, no mesmo espaço, durante três dias, realizar centenas de atividades como debates, exposições culturais, feira do livro, mostras teatrais, grandes shows e grandes espetáculos, como a apresentação da Orquestra Sinfônica de Lisboa, com um concerto magnífico.

Por tudo isso que eu digo que é uma festa fascinante, é algo de encher os olhos, é algo de emocionar quem participa.

A festa não é só cultural, como é que se dá a discussão política dentro desse grandioso evento? Falou-se a respeito da questão dos refugiados?

Presenciamos debates sobre as temáticas geopolíticas da atualidade. As questões ligadas ao Oriente Médio, aos processos políticos latino-americanos, como por exemplo Cuba e Venezuela, o tema da África, o tema da intervenção externa na Ucrânia, a luta contra a militarização, a questão da Otan – que faz parte da militarização –, das armas nucleares e obviamente também o problema dos refugiados.

Os debates evidenciam que a questão dos refugiados é uma demonstração de imensa hipocrisia das potências imperialistas, porque a tragédia que acometeu a Líbia, o Iraque e, principalmente, a Síria, foi fomentada pelas intervenções militares e pela estratégia do imperialismo, que escolheu como alvo principal da sua ação, no caso da Síria, a derrubada do governo de Bashar al-Assad e, para isso, chegou a cometer a insanidade de instrumentalizar o que acabou se transformando no chamado Estado Islâmico.

A senhora Angela Merkel e o monsieur François Hollande e mr. Obama estão agora a derramar lágrimas de crocodilo, o que revela a hipocrisia dos imperialistas da União Europeia e dos Estados Unidos.

Você esteve na Festa com um dos Cinco Heróis cubanos, Gerardo Hernandez. Conte-nos um pouco sobre esse encontro.

Ele estava acompanhado de sua esposa e de sua filha recém-nascida e transborda alegra e otimismo pela vida, apesar de tudo que passou na prisão nos Estados Unidos. Houve um ato emocionante com a presença dele. Foi ovacionado quando falou e quando foi homenageado. Foi ovacionado também no momento que seu nome foi citado no grande comício final. Foi muito gratificante, para nós, encontrarmos com Gerardo Hernandez.

A gente vê claramente que é um homem cheio de energia, de capacidade, disposto a levar adiante a luta de seu país contra o bloqueio e pela construção renovada do socialismo em Cuba. É um homem que tem brilho nos olhos.

Gerardo também está disposto a levar adiante a causa da solidariedade entre os povos e é um companheiro cheio de gratidão pela solidariedade que recebeu dos povos de todo o mundo, especialmente do povo português, das organizações solidárias.

E o PCdoB na festa, como é a participação dos comunistas brasileiros?

O Partido tem um estande na festa que é muito concorrido. Além de apresentar materiais políticos do Brasil e publicações do PCdoB, é um estande dos mais concorridos da festa, com atrações bem brasileiras, vendendo milhares de caipirinhas e feijoadas. Há ali uma enorme interação entre portugueses e brasileiros. Nós temos uma equipe de militantes brasileiros lá e, além dos portugueses, companheiros de outros partidos internacionais também frequentam nosso estande. Gostaria de destacar também que, no ano que vem, vamos completar 10 anos da presença do PCdoB na festa.

No dia 4 de outubro teremos eleições legislativas em Portugal, que avaliação você faz do papel do evento na propaganda eleitoral?

A Festa do Avante! reforçou o campo eleitoral do PCP e da CDU – A Coligação Democrática Unitária – da qual o PCP faz parte e que concorrerá às eleições do próximo dia 4 de outubro.

Jerónimo Sousa discursa para multidão presente à festa

As palavras centrais do comício de encerramento da festa foram pronunciadas pelo secretário-geral do PCP, o camarada Jerónimo de Sousa. Nesse comício, o camarada não só denunciou todas as mazelas da ação do imperialismo estadunidense, da União Europeia e da Otan no mundo de hoje, todas as intervenções, como fez um discurso de otimismo em relação ao desenvolvimento da luta dos povos e, além disso, fez uma análise circunstanciada da realidade portuguesa.

Ele desmascarou as políticas neoliberais e conservadoras da direita, que têm sido levadas a cabo em Portugal pelo governo atual e que já tinham sido conduzidas pelo governo do Partido Socialista, e apontou de maneira bastante clara a perspectiva da luta por uma nova política patriótica e de esquerda para Portugal, acenando, portanto, com a renovação da esperança, otimismo e confiança.

Essas foram as palavras-chave do camarada Jerónimo, dando assim um novo ânimo aos eleitores do PCP e da CDU, para enfrentar essa grande batalha do dia 4 de outubro. Nós saímos de lá certos de que da Festa do Avante! resulta um fortalecimento político, ideológico e orgânico do PCP e resulta também, não há dúvidas, no fortalecimento eleitoral.

Eu não tenho dúvidas de que a CDU, que é a coligação da qual o PCP participa junto com os seus aliados da Intervenção Democrática e o Partido Os Verdes, fará um percentual maior do que tem feito e elegerá mais deputados, o que é obviamente um reforço na luta do povo português e dos povos europeus contra essas políticas de ruína nacional, levadas a efeito pela União Europeia.

Em 2016 será realizada a 40ª edição da Festa, com um realce ainda maior e com programação especial para assinalar as quatro décadas da Festa do Avante!

E a festa do L'Humanité?

A festa do L'Humanité é tão grandiosa quanto. É também, no plano da França, o maior acontecimento político-cultural do país. As duas festas são dois dos maiores acontecimentos políticos e culturais da Europa. O modelo da festa em geral é a presença dos estandes dos comitês regionais do PCF, ali estão representados todos os comitês regionais do partido, e há um grande espaço internacional, que eles chamam de Village du Monde. Essa foi a 80ª edição dessa grandiosa festa.

É um espaço magnífico, você tem ali representados dezenas de países, de movimentos anti-imperialistas, as principais causas da luta dos povos, da luta pela paz, da luta antimilitarista, da luta por uma nova ordem. Também se realizam muitos debates sob os mais variados temas e é também, eu diria, uma demonstração do internacionalismo do PCF e uma atitude de congregação de organizações socialistas, comunistas, revolucionárias e anti-imperialistas de todo o mundo.

Merece grande destaque a realidade latino-americana. Nós pudemos expor para uma plateia numerosa, em nome do PCdoB, nossa opinião sobre o que está acontecendo no Brasil.

Procuramos explicar o fundo da crise política e econômica do país. Demonstramos que a crise política é fruto da não aceitação por parte da oposição da sua quarta derrota consecutiva, da decisão dela de recuperar o poder custe o que custar.

Já a crise econômica tem muito a ver com o modelo que foi implantado há décadas no Brasil e que muitas circunstâncias fizeram com que o nosso governo não tivesse condições de acumular forças, tanto do ponto de vista nacional como mundial, para romper com isso, porque não é fácil romper com o modelo neoliberal e conservador financista implantado no nosso país.

A uma plateia bastante solidária com o povo brasileiro e com o nosso partido, eu pude explicar que o PCdoB, e as demais forças democráticas do nosso país, têm como prioridade a defesa do mandato democraticamente conquistado nas urnas em outubro do ano passado pela própria Dilma Rousseff.

Um mandato legítimo e constitucional e que para nós é inaceitável qualquer suposta saída política que não contemple a preservação do mandato da presidenta. Para nós não é indiferente ter um governo com a Dilma ou sem ela. Não é aceitável um golpe que tire a Dilma e entregue a faixa presidencial, a cadeira, ao vice-presidente da República, ainda que ele seja o titular de um partido aliado. Mesmo assim, configurará um golpe. A estratégia do impedimento não é aceitável, ainda que se diga que o impeachment é para colocar no poder um aliado.

A presidenta Dilma não está enquadrada em nenhum dos quesitos previstos na Constituição para impedi-la de exercer o cargo. Não há vestígio de nenhuma ação conotada como crime de responsabilidade. Então, não há razões objetivas para sua derrubada. Baseamo-nos também no fato de que a presidenta apesar das dificuldades momentâneas e de ter que operar algumas medidas de ajuste para equilibrar as contas do governo, continua mantendo no horizonte uma política de reformas sociais, de reformas democráticas, de aprofundamento da democracia e de defesa da soberania nacional, de inserção soberana do Brasil no mundo, de transformação da América Latina e do Brics em polos importantes de reconfiguração da ordem mundial.

Disse aos companheiros presentes que tudo isso justifica que o PCdoB prossiga no seu apoio indeclinável ao governo da presidenta Dilma Rousseff e, também, porque confiamos na capacidade das forças progressistas brasileiras de se unirem e de formarem uma ampla aliança de forças políticas e sociais, com caráter democrático nacional e popular, para criar uma força política capaz de deter o golpe e de levar adiante e impulsionar as reformas estruturais.

Também falei sobre a capacidade de mobilização do povo, como foi demonstrado no dia 20 de agosto. Inclusive cheguei a anunciar que dia 3 de outubro haverá uma nova manifestação, o que transmite aos companheiros que nos acompanham mais otimismo.

A forma como os franceses veem a crise política é semelhante à do Brasil, com a mídia distorcendo os acontecimentos?

Os jornais falaram muito disso e chega ao público europeu uma imagem distorcida do que é o Brasil. Eles reproduzem o que as agências de notícias brasileiras emitem. O caso é mais grave ainda em Portugal, pelo fato de que temos a mesma língua. A Rede Globo está presente na Europa por meio de seu canal internacional, por meio de parceiras locais, e a Rede Record está presente com seus programas obscurantistas, de fundo pentecostalista, com todo respeito que a gente tem pelas religiões, mas o que ela faz é um massacre de consciências. A Globo e a Record transmitem uma imagem falsa do Brasil, passam uma má imagem do país.

Na Festa do L'Humanité também foi abordada a questão das eleições na França e dos refugiados?

No comício de encerramento da Festa, o camarada Pierre Laurent, secretário nacional do PCF, fez um discurso bastante abrangente, onde toca na questão dos refugiados, onde abordou com profundidade o tema do Oriente Médio.

Ele clamou por uma nova ordem mundial, denunciou as políticas falsas e intervencionistas de François Hollande, do PS francês e, além de fazer essas abordagens internacionais, fez abordagens nacionais muito apropriadas porque mostrou que o PS conduz políticas internas neoliberais, conservadoras e que nada ficam a dever à direita.

A Festa se realiza no momento em que a França se prepara para dois grandes eventos. Um é a eleição regional, que tem um novo desenho do mapa regional no país, com as eleições marcadas para o fim do ano. O PCF se prepara para uma grande jornada, concorrendo com seus próprios candidatos. Além disso, concorre com candidatos da Front de Gauche (Frente da Esquerda), que é uma coligação do PCF com o Partido da Esquerda. Laurent, o secretário nacional do partido, é candidato pela grande região de Paris.

A festa reforça as posições do PCF e da esquerda para o embate eleitoral do final do ano.

O outro evento que já está sendo muito comentado na França e camaradas estão atentos por que levam em conta a questão ambientalista como um problema de direitos sociais e de sobrevivência do planeta, é a cúpula ambiental COP-21 Paris, em dezembro.

Será um grande acontecimento mundial onde estarão os chefes de Estado para discutir a questão ambiental. Pelo que percebi dos camaradas, a orientação é de denunciar na COP-21 o caráter predatório do capitalismo e das grandes potências capitalistas, reforçando a ideia principal de que a predação do planeta, a piora das condições ambientais do mundo, são causadas pelo capitalismo.

Veja o vídeo final da Festa do Avante! 2015



Do Portal Vermelho, Humberto Alencar

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